06 May 2024


Prêmio Palma de Ouro - filme O Pagador de Promessas

Publicado em Luiz José M. Salata
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Há exatos 60 anos o cinema brasileiro recebia sua principal recompensa internacional. Dia 23 de maio de 1962, O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte, ganhava a Palma de Ouro, principal prêmio de Cannes, o mais prestigioso festival de cinema do mundo. O filme vitorioso Palma de Ouro foi um divisor de águas na história do cinema brasileiro, o mais premiado do mundo naquele momento. Na cidade francesa, ele derrotou 34 outros filmes de 27 países diferentes, ou seja, cineastas muito famosos da época. São nomes hoje consagrados no cinema e que foram derrotados por Anselmo Duarte, em 1962. As comemorações se justificam, pois além do significado dessa premiação única para um país sedento de reconhecimento externo, houve na época a improbabilidade dessa vitória. A despeito das suas inegáveis qualidades, ainda espanta que esse texto de Dias Gomes, adaptado para a tela por Anselmo Duarte, tenha superado um conjunto de obras-primas presentes em Cannes naquele ano. Basta lembrar três delas - O Anjo Exterminador, de Luis Buñuel, O Eclipse, de Michelangelo Antonioni, O Processo de Joana D'Arc, de Robert Bresson. O folclore em torno dessa premiação é vasto, pois dizem que o júri ficou dividido entre dois concorrentes e Pagador surgiu como o tertius de conciliação. Outra hipótese é que Pagador seria o representante de uma cinematografia de prestígio à época na Europa - o Cinema Novo. E então teria sido premiado mais por fazer parte dessa onda (o que é um equívoco) e menos por suas qualidades intrínsecas. A verdade é que o Cinema Novo não tinha ainda lançado suas obras-primas, Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, Os Fuzis, de Ruy Guerra, e Deus e o Diabo na Terra do Sol, realizadas e exibidas entre 1963 e 1964. Mas o movimento já gozava de renome e tinha-se como certo que o representante brasileiro em Cannes seria o impactante Os Cafajestes, de Ruy Guerra, filme original e irmão de alma da nouvelle vague francesa. O Cinema Novo viera para revolucionar forma e conteúdo, e os dois filmes, para os do cinema novo, eram ainda excessivamente tradicionais, vinculados a uma estética herdada do cinema norte-americano ou aparentada à Vera Cruz, companhia paulista de sotaque europeu, mesmo ao filmar temas nacionais. Hoje essas discussões parecem um tanto desbotadas.
Com a revisão, O Pagador de Promessas poderá até reavivá-las, talvez sob nova perspectiva. Permanecem a eficiência com que a história é contada, a pegada épica e socialmente ambiciosa do cinema brasileiro de então, a beleza da fotografia, a qualidade do texto, a força do elenco. A história se passa na década de 1960, na Bahia, e começa com uma promessa de Zé do Burro que pede a Santa Bárbara para salvar seu burro, que fora ferido por um galho de árvore. Como na cidade não havia uma igreja dedicada à santa, a promessa foi feita em um terreiro de candomblé, onde a santa ganha o nome de Iansã. Zé do Burro, portando uma cruz nos ombros, e sua mulher, Rosa, caminham sete léguas do sertão baiano até Salvador com o intuito de pagar a promessa. Chegam a Salvador de madrugada, alojando-se nas escadarias da igreja dedicada à santa. São interpelados pelo sedutor Bonitão, que se aproveita da ingenuidade de Zé do Burro para seduzir Rosa. A mulher resiste no início, mas acaba por passar a noite com ele em um quarto de hotel. Ao contar ao padre que a promessa fora feita em um terreiro de candomblé a Iansã, Zé é impedido de entrar na igreja. Obstinado, ele insiste em permanecer, ignorando os apelos da mulher para partirem. Zé do Burro torna-se assunto na cidade e acaba alvo de um repórter sensacionalista, que distorce os fatos e o retrata como um messias que apoia a reforma agrária. Ao saber por Marli, uma prostituta apaixonada por Bonitão, que Rosa passara a noite com o homem, Zé começa a dar vazão à sua revolta. Já Bonitão, decidido a se livrar de Zé para poder se aproveitar de sua esposa, convence o policial, Secreta, da credibilidade da versão do jornal.
Após muita insistência, o Monsenhor tenta persuadi-lo a refazer a promessa para que possa entrar na igreja. Desacatando as considerações do eclesiástico, Zé se enfurece e termina autuado pela polícia. Recusando-se a ir detido, tenta desesperadamente entrar na igreja com a cruz para cumprir sua promessa, ao que é assassinado pelo Secreta, em conflito violento entre os manifestantes, muitos capoeiristas e policiais. Os capoeiristas, por fim, fazem entrar na igreja o seu corpo de Zé do Burro morto em cima da cruz, e entram à força da igreja, cumprindo assim a promessa para Santa Bárbara. Numa época de intolerância religiosa e regressão cultural, essa história de embate entre a força popular e a ordem estabelecida ganhou nova, mas triste realidade a partir daquela atualidade.

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