18 Apr 2024

Publicado em TITO COSTA
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Esse é o título de um dos capítulos mais impressionantes do livro de Laurentino Gomes sobre Escravidão (Ed. Globo livros, vol. I), recém lançado  e já entre os mais vendidos. Todas as suas mais de 400 páginas contêm dados e relatos interessantes sobre a escravidão, essa mancha negra na história do Brasil com reflexos ainda hoje na vida dos negros em nosso país. Da vida, do sofrimento, da revolta que desperta sua simples leitura séculos depois da abolição decretada oficialmente em 1888, mas que na prática persistiu  por longo período.
Do leilão de escravos ao tratamento violento a que eram submetidos os infelizes cativos, o autor nos relata uma  dolorosa e desumana realidade que causa vergonha e uma certa revolta a todos nós, ainda hoje, por mais que tentemos explicar e justificar esses fatos. Autoridades eclesiásticas da Igreja Católica, então envolvidas no tráfico e utilização do trabalho escravo chegam a nos  causar uma estranha sensação de descrença nos ensinamentos cristãos, ainda hoje, passados alguns séculos dessa vergonhosa página de nossa história e do envolvimento dela por papas, bispos, autoridades religiosas e cristãos em geral. Um exemplo: o padre Antonio Vieira que tem lugar de estaque na história da Igreja, sustentava que aos escravos cabia não apenas aceitar o sofrimento do cativeiro, "mas se alegrar com a inestimável oportunidade que tinham de imitar os sofrimentos de Jesus no calvário". São palavras suas transcritas no livro, pelo seu autor: "Bem aventurados vós que soubéreis conhecer a fortuna de vosso estado, e com a conformidade e imitação de tão alta e divina semelhança, aproveitar e santificar o trabalho. Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado porque padeceis em um modo muito semelhante a que o mesmo Senhor padeceu na sua cruz e em  toda a sua paixão". Lembra o autor que a Igreja reconhecia o casamento de cativos e defendia a proteção da família, mas isso nunca impediu que maridos e esposas, pais e filhos fossem separados nas transações do comércio de escravos.
E havia "uma moral cristã" da escravidão, como constava de diversos livros e ensaios quase todos de jesuítas contribuindo para a organização e disciplina dessa "moral". E ainda falavam dirigentes cristãos, padres e mesmo bispos, que em vez de condenar a escravidão ainda criaram um projeto escravista dos religiosos, ou seja, ajudaram a construir a base ideológica do regime escravagista no Novo Mundo.
Um certo autor italiano Jorge Benci exerceu importantes funções com jesuítas na Bahia e foi considerado entre o ideólogos principais do regime de escravidão. Esse autor e colaborador dos jesuítas, sem nenhum pudor sustentava que "um dos efeitos do pecado original  de nossos primeiros pais Adão e Eva foi abrir as portas para a entrada do cativeiro entre nós",  como se a maldade extrema dos escravagistas tivesse origem na doutrina da Igreja (pág. 341). Lembra Laurentino Gomes que "o envolvimento da Igreja com a escravidão era antigo e bem anterior ao tráfico de africanos para a América".
Uma bula papal de 8 de janeiro de 1455, "carta régia do imperialismo português" autorizava o  príncipe dom Henrique, o Navegador, a escravizar não apenas os muçulmanos, mas todos os pagãos entre o Marrocos e a Índia.
Em 1888, às vésperas da assinatura da Lei Áurea brasileira, o papa Leão XIII condenou a Igreja de forma inequívoca por sua adesão ao escravismo.
Para encerrar estas breves anotações sobre a escravidão e a participação de Igreja católica, extraídas do livro de Laurentino Gomes "Escravidão", destaco os versos de um concurso de poesia  de 1552 de autoria de um traficante de escravos considerado vencedor: "Com fazenda de lei de Graça e vida/Divino Xavier, a este contrato/Vos manda e avisa que vendais barato/A responder no céu qualquer partida" (pág. 147).

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